CLIENTES X VENDEDORES
O procedimento dos comerciantes em relação à clientela vem mudando bastante nos últimos anos e isso se deve ao fato do aumento populacional, as facilidades de consumo e, por outro lado à violência com que muitos são surpreendidos em seus locais de trabalho, fazendo com que com que muitas coisas saiam do controle e exijam uma mudança drástica nos seus hábitos diários.
Em vários lugares por onde eu ando, tenho observado um comportamento impaciente por parte dos vendedores. Na hora em que vamos provar alguma roupa no vestiário, é comum baterem à porta para saber se a peça que acabaram de nos entregar serviu em nosso manequim... só se fôssemos flash man... Calculam o tempo de maneira errada como se trocássemos de roupa num piscar de olhos. Não nos dão tempo nem para nos despir... É tudo a jato. E, ainda, não raro, há as vendedoras que simplesmente recuam as cortininhas sem nos pedir licença. É o cúmulo mas acontece.
Outra coisa bastante irritante ocorre no momento em que vamos digitar a senha do cartão. Tem umas que nem sequer olham em outra direção, muito pelo contrário, fazem questão de ficar acompanhando cada movimento dos nossos dedos e aprender os números que clicamos na máquina. Ora, as pessoas não se sentem a vontade com um tipo de controle dessa natureza. Qualquer dia, saio do sério e rodo a bahiana...
Porém, o mais absurdo é quando terminamos de concluir o pagamento numa loja ou lojão e antes que consigamos colocar a carteira dentro da bolsa e fechar o zíper , a pessoa responsável pelo Caixa nos enfia a sacola no nariz numa demonstração de pressa como se desejando que evaporássemos da sua frente. Não é assim que se conquista clientes. E, por último, bastante rotineiro é ficarmos procurando pelo nosso pacote contendo nossas compras depois de efetivarmos o pagamento das mesmas e constatarmos que ele está nas mãos da vendedora próximo à porta de entrada e bem lacrado para evitar que algum espertinho tire proveito da situação enquanto passa pelas mercadorias expostas por todos os lados.
É compreensível que se redobrem os cuidados no comércio por causa dos maus elementos que existem em nossa sociedade onde os bons acabam pagando pelos maus contudo, muitas vezes esse comportamento fica exageradamente evidente, o que pode melindrar certos indivíduos e afastá-los em definitivo de certos ambientes que primam pelo excesso de suas regras.
Elisabeth Souza Ferreira
( Escritora e Ex-Presidente da Academia Passo-Fundense de Letras)
LIVROS OCULTOS
Lembro-me de uma ocasião em que veio a Passo Fundo um notável orador para dar palestra na Catedral e eu, acompanhada dos meus pais, não conseguimos entrar porque estava lotada de pessoas sedentas para ouvi-lo. Ficamos na porta mesmo, junto com tantos outros curiosos que se empurravam em busca de uma brecha para poder escutá-lo melhor. Não consegui ver o jeito do homem que falava mas a sua voz era perfeitamente audível graças ao microfone e às caixas de som. Ele contava sobre ter sido ateu durante grande parte da sua vida até o momento em que se converteu à Religião Católica. Chamava-se Neimar de Barros e era autor de vários livros de cunho religioso que fizeram muito sucesso por uma década. Dentre estes, "Deus Negro" era o principal e que fui obrigada a ler no Colégio valendo nota para Religião. Na época, ele era muito requisitado para discursar de ponta a ponta do Brasil, tendo ficado tão conhecido quanto o Paulo Coelho dos nossos dias. Viajava sempre a serviço da Igreja e se hospedava na residência dos padres e bispos, de onde pôde ver de perto e analisar o comportamento dos religiosos com os quais passou a conviver. E dessa convivência por longos anos, passou a colecionar decepções pois os "superiores" costumam dizer uma coisa e praticar outra bem diferente. Começou, então, a questionar a atitude de algumas pessoas daquele meio até que se tornou indesejável por se recusar a guardar certos segredos. Percebendo a realidade do problema, resolveu se afastar, dando uma entrevista à Revista Veja em 1986, que escandalizou a sociedade que o idolatrava como um dos escritores mais renomados. Em consequência disso, a Igreja ou outra entidade qualquer que estava por trás dessa máquina, mandou recolher das Livrarias todos os seus livros e dentro de pouco tempo, já não se ouvia mais falar em Neimar de Barros como antes. Por causa desse episódio ocorrido durante a minha infância, a sua obra praticamente desapareceu das prateleiras e ele deixou de existir como um dos mais fortes formadores de opinião para a juventude cristã daquela época. Desde, então, falar em Neimar de Barros se tornou um grande tabu.
É interessante como o mundo reage negativamente, às vezes, diante de um simples comentário ou atitude por parte de um indivíduo que, como qualquer outro, tem o direito de mudar de pensamento e de direção. E os seus livros? Os seus livros foram julgados e condenados à inexistência, banidos do comércio simplesmente porque o autor já não era mais conveniente no meio em que atuava. Cito esse exemplo porque isso ocorre com muito mais frequência do que se imagina. Muitos escritores passam por isso.
Meus dois primeiros livros foram psicografados dentro de um Centro Espírita e enquanto lá permaneci fui muito requisitada por pessoas que chegavam desesperadas em busca de resposta para suas dúvidas e apoio para os seus mais diversos problemas. Elas saíam aliviadas e eu, carregada de energias negativas. Foram anos difíceis para mim. A psicografia não pode nem deve ser cronometrada no relógio pois nunca sabemos quanto tempo uma entidade vai levar para transcrever ao papel a sua mensagem. Há algumas que escrevem muito rápido. Outras demoram muito. E não podemos atropelá-las pois o maior prejudicado é o médium. Aconteceu várias vezes comigo. Eu estar psicografando e, de repente, tocarem a sineta para avisar que o tempo havia acabado. E logo dariam início aos trabalhos de passes. Eu entendia perfeitamente essa regra mas os espíritos nem sempre aceitavam ter que se afastar sem ao menos colocar um ponto final no seu texto. E a parte que eles mais gostavam eram as despedidas. Resultado: Eles davam um jeito de me achar em casa para terminar o que haviam começado no Centro Espírita. E não me deixavam em paz enquanto eu não me dispunha a colocar papel sobre a mesa e concluir a mensagem. Tenho vários dons mediúnicos além da psicografia. E, na minha opinião, o pior deles é o da incorporação. Eu levava uma semana para voltar ao normal após cada incorporação. Os que escrevem geralmente estão em condições de escrever. Mas, os que incorporam quase sempre são sofredores e o que eles mais fazem é chorar. Cada incorporação desse tipo causa um tremendo esgotamento físico e mental no médium. Eu vivia com os olhos inchados e o semblante abatido. Meus pais sofriam junto comigo. Passaram, então, a tomar providências para me libertar desse pesadelo em que eu vivia. Eu já não estava mais suportando viver daquela forma. Comecei a ler outras obras e a frequentar outras religiões. Fui me fortalecendo aos poucos e resolvi me afastar do Centro Espírita. As incorporações cessaram e eu continuei a psicografar somente em casa sem nenhum stress. Recebi inúmeras mensagens ao longo dos anos que se sucederam e pude ajudar muitas pessoas. Acredito ter feito a minha parte. Abandonei o Centro mas o meu dom não me abandonou. Descobri que tinha segurança mediúnica para trabalhar sozinha sem a necessidade de estar cercada de pessoas que não sabiam me dar o suporte de que precisava. Os meus livros? Eu tinha aonde vendê-los. Não me preocupava com isso. Por mais de dez anos, tive uma Livraria mística bem no centro da cidade. O que eu não sabia era que, pelo fato de ter me afastado do Centro Espírita, os meus livros deixaram de ser relevantes para a Doutrina Espírita. Sempre que eu tentava colocá-los à venda em outras livrarias, logo vinha a observação sobre o meu afastamento da Doutrina. Isso parecia ter mais importância do que o conteúdo dos livros psicografados na época em que eu frequentava o Centro. Era como se eles tivessem se tornado proibidos para a leitura.
Cada pessoa tem os seus motivos para permanecer ou para se afastar desta ou daquela religião. Eu tive os meus. E paguei um preço alto demais por dar um basta a tudo aquilo que me fazia sofrer pois assim como os livros do Neimar de Barros, os meus também se tornaram ocultos por força de uma mudança justa de direção.
Elisabeth Souza Ferreira